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Para a Antaq, seca no Sudeste prejudicou transporte hidroviário e setor energético foi poupado.

Diretor Geral Antaq – Mário Póvia

O transporte de grãos, como soja e milho, despencou 30% no primeiro semestre de 2014, se comparado a igual período de 2013, na navegação interior.

O dado está no relatório semestral, divulgado pela Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquaviários), neste mês. O problema foi causado, principalmente, por causa dos regimes de chuva no Norte (com as cheias) e no Sudeste (com a estiagem).

À Agência CNT de Notícias, o diretor-geral da Agência, Mário Povia, falou sobre os resultados e criticou a decisão de suspender a navegação na hidrovia Tietê-Paraná. Na avaliação dele, os efeitos da seca sobre o setor poderiam ter sido amenizados se outras medidas fossem debatidas. As operações na hidrovia foram suspensas há mais de dois meses, já que os recursos hídricos passaram a ser destinados prioritariamente para a geração de energia elétrica, a fim de garantir o fornecimento na região.    

Apesar disso, os resultados globais do período para o setor são positivos. O setor portuário movimentou 460 milhões de toneladas, com crescimento de 5% em relação aos primeiros seis meses de 2013. Um dos destaques, na avaliação da Antaq, foi para a cabotagem, que transportou 70 milhões de toneladas. Em quatro anos, o crescimento chega a 17,2%. O incremento mais expressivo entre 2013 e 2014 foi na carga conteinerizada, de 6,8%. 

Leia alguns trechos da entrevista concedida por Mário Povia.

O relatório semestral sobre o setor demonstra que a movimentação de cargas nos portos cresceu, atingindo mais de 460 milhões de toneladas. O novo marco regulatório do setor, que entrou em vigor no ano passado, já impacta nos resultados?

Eu acredito que sim. O crescimento de contêiner na cabotagem, por exemplo, já é reflexo de alguma oferta de terminais que entraram em operação em Santos. Esses terminais já vinham com investimentos em andamento, mas esse incremento na oferta de infraestrutura é sistêmico. A gente já começa a sinalizar com novas outorgas de TUPs (Terminais de Uso Privado) e isso a gente verá um reflexo posteriormente. Mas temos reflexos imediatos do novo marco, como o porto 24 horas, a redução da burocracia, que o Conaportos (Comissão Nacional das Autoridades nos Portos) vem tratando, um sistema de logística inteligente, que permitiu um fluxo sem filas da safra de 2013/2014 no Porto de Santos, a questão da gestão portuária, melhorias na gestão em algumas companhias docas… Isso tudo dá um resultado imediato.

No semestre, houve a cheia no Rio Madeira e a estiagem no Sudeste, que afetou a hidrovia Paraná-Tietê. Que tipo de reflexos essas situações geram para a navegação interior?

Tivemos um regime hidrológico complicado desde o final do ano passado. No Madeira já temos mitigado esse efeito. O rio começa a voltar ao normal, ainda que tenhamos problema de cheia em Manaus. Esses são fatos totalmente imprevistos, da natureza, que a gente tem que conviver e efetivamente desequilibra o sistema. Essas cargas acabam ou não sendo escoadas, ou não sendo adequadamente transportadas. Na questão do Madeira, o problema ainda se estendeu muito além da navegação, afetou diretamente as comunidades. Foi um evento que não ocorria há 80 anos.

Para o segundo semestre esperamos resultados melhores no Madeira. Já na hidrovia Tietê-Paraná, ainda temos a questão da seca impactando negativamente, paralisando as operações e vamos ter um impacto ainda mais negativo no segundo semestre. Não acredito que antes de novembro tenhamos a retomada da hidrovia. O problema é que continua não chovendo e se fala já em problema de abastecimento humano. Então, por enquanto, teremos que conviver com uma sobrecarga nos modais ferroviário e rodoviário, como alternativa à hidrovia.

No caso da estiagem, quais são os impactos mais significativos? A Antaq até cita perda de confiança no setor…

A crítica que faz é que se parou a hidrovia sem fazer uma discussão. Talvez nós pudéssemos ter uma redução da atividade, não uma paralisação completa. Era uma questão que gostaríamos de ver melhor equacionada. Essa decisão tem que partir de um órgão neutro, como a ANA (Agência Nacional de Águas) ou a Casa Civil, e não o ONS (Operador Nacional do Sistema) ou o Ministério de Minas e Energia, que têm um interesse específico no tema. Nós reconhecemos a dificuldade que o setor elétrico tem com relação a essa questão, é legítimo e já se fala em problemas no abastecimento humano. Mas a gente queria um modus operandi diferenciado, com uma discussão maior antes de tomar uma medida de forma unilateral. Essa é nossa crítica. A nossa estimativa é que a hidrovia movimentasse, neste ano, sete milhões de toneladas. Esse é o tamanho do prejuízo que vamos ter com soja, combustíveis, petróleo e derivados, celulose. Esse é o tamanho do gargalo que vai gerar tanto na ferrovia quanto na rodovia, gerando filas, aumento de fretes e perda de eficiência.

Portos parados e férias coletivas…

E desemprego. Porque se você para um modal por sete, oito meses, você não vai ficar pagando. E a perda de confiança do modal, com certeza. O assunto foi mal conduzindo. Parece-me que houve uma sangria na hidrovia, enquanto o setor elétrico sequer começou a cortar gordura. É com isso que a gente não concorda. Mas a gente reconhece que, agora, há pouco a se fazer. As chuvas não vieram, então vamos ter que aguardar, no mínimo, até o final de outubro.

Quanto à cabotagem: o setor ainda pontua uma série de entraves para aumentar o uso dessa modalidade, como burocracia, falta de embarcações de bandeira brasileira, de mão de obra qualificada. Como isso pode ser superado de modo a se explorar mais esse potencial que o Brasil tem?

O diagnóstico está feito. São essas as impedâncias para o crescimento da cabotagem e acho que agora faltam as medidas. Temos que tomar medidas para desonerar combustível, reduzir burocracia. A minha grande aposta na cabotagem é com operadores multimodais, aqueles que asseguram o porta a porta. Não adianta você usar um modal mais barato se você não tiver a certeza de que sua mercadoria estará na sua planta no dia em que você precisa. Confiança, assegurar que a carga estará no dia e local combinados, que é o que o modal rodoviário oferece, a cabotagem também tem que oferecer. E isso eu vejo com um operador multimodal, aquele que tenha domínio de toda cadeia, pelos menos enquanto não estruturamos de forma compartimentada esse segmento. Então eu apostaria nisso. Também é uma questão de política pública, do Ministério dos Transportes, Secretaria de Portos, ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres), Anatq, empresários fazerem um grande debate, com todo apoio, para definirmos e implementarmos medidas. Já está maduro para acontecer. Falta só um empurrãozinho, mas acho que será em breve.

Natália Pianegonda

Fonte: Agência CNT de Notícias.

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