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Defasagem no valor dos fretes já chega a 10,14% neste ano

 

O predomínio do modal rodoviário, somado aos gargalos de infraestrutura, geram uma equação de difícil resolução. Pelos cerca de 1,7 milhões de quilômetros de estrada – dentre os quais apenas 12,5% (218 mil quilômetros) são pavimentados – passam 58% do volume nacional de cargas. As péssimas condições das estradas e o elevado valor dos combustíveis são responsáveis por aumentar, ano após ano, o preço dos principais insumos associados à composição das planilhas de encargos das empresas que fazem frete.

Apenas no primeiro semestre deste ano, a variação média do transporte de carga, avaliada pelo Índice Nacional do Custo do Transporte de Carga (INCT), registrou alta de 10,91% para as cargas fracionadas e 8,01% para cargas lotação. Em 2015, por exemplo, os dados do Departamento de Custos Operacionais, Estudos Técnicos e Econômicos da NTC&Logística (Decope) também revelam uma defasagem de 10,14% entre o valor dos fretes praticados e os custos efetivos da atividade no Brasil.

A pesquisa realizada com 300 empresas é um reflexo da piora da situação das transportadoras quando comparadas ao ano anterior. Essa justificativa é apontada por mais de 80% dos entrevistados. Os grandes vilões são de fácil identificação. Após dois reajustes, o preços do óleo diesel registram aumento de 12,24% (S-500) e 13,10% (S-10) no período de 12 meses. Além disso, os salário, cujo último dissídio ficou em 9%, em São Paulo, também contribuem para a deterioração do quadro. Como resultado, as chamadas despesas indiretas saltaram 10,89%, percentual que supera inclusive a inflação do acumulada do período (9,56%).

Na mesma linha, o diretor técnico da Associação Nacional do Transporte de Cargas e Logística (NTC&Logística), Neuto Gonçalves dos Reis, já projeta mais onerações em curto prazo para o setor. “Deve vir mais aumento para o diesel. O último aumento abrange apenas o repasse da Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico). Pode-se dizer que, neste ano, o combustível ainda não foi repassado. Isso deve ocorrer até novembro”, antecipa. Segundo ele, atualmente, em longas distâncias, o diesel é fator que mais pesa. Nos deslocamentos mais curtos, os salários ajudam a elevar os custos.

Por outro lado, o professor de Logística da Universidade Mackenzie de Campinas, Mauro Roberto Schlüter, destaca que, dependendo do tipo de operação, as variáveis de custo tendem a ser modificadas. Nas cargas fracionadas, comenta o especialista, as planilhas de custos são muito mais complexas e, às vezes, é impossível determinar valores exatos. Isso ocorre porque as operações de entrega não se repetem, e existe uma dinâmica diferente para as coletas e descargas.

“O pequeno e médio empresário do setor de transporte que trabalha com cargas fracionadas não consegue visualizar com clareza os seus custos e perdas. Existem prejuízos imprevisíveis no meio do mês, período em que a demanda tende a diminuir para os carros-linhas. Muitas empresas mantêm o caminhão para fazer linhas exclusivas.

Uma carga hipotética de Novo Hamburgo para Campinas (SP) antes vai até Porto Alegre, onde faz um transbordo e parte em um carro linha até São Paulo. Chegando lá, faz outro transbordo e outro carro linha realiza a entrega em Campinas. Estes carros-linhas fazem os percursos regularmente e ficam ociosos na baixa demanda”, exemplifica.

O professor alerta também que as planilhas-padrão não funcionam. O que se aplica, em alguns casos, é um modelo simplificado como o de margem bruta, que foi criado e implantado na expresso Mercúrio até a venda da companhia para a TNT. A lógica, segundo Schlüter, está sendo cogitada, inclusive, pela NTC em um programa voltado à orientação das empresas de médio porte.

Veículos autônomos prometem revolucionar o sistema logístico

O debate sobre o aumento dos custos nos transportes de cargas, cada vez mais, converge para os benefícios prometidos por uma série de projetos que buscam ampliar a autonomia dos veículos de cargas. O professor de Logística da Universidade Mackenzie Campinas, Mauro Roberto Schlüter, é autor de artigos sobre o tema. Para ele, a revolução tecnológica pode estar mais próxima do que se imagina, ou seja, em um prazo pouco superior a 10 anos.

Schlüter destaca que a utilização dos veículos autônomos – em fase avançada de testes no País e nos Estados Unidos – possibilita uma infinidade de projeções relacionadas à erradicação das perdas no transporte de cargas. Como consequência, a tendência é de que haja a diminuição de custos e também a melhoria da qualidade dos serviços prestados no sistema logístico.

“Existem aplicativos de economia compartilhada que já estão revolucionando o transporte urbano, como por exemplo o Uber e o Waze. O Waze já oferece a possibilidade de fixar um percurso para que as pessoas interessadas se desloquem até determinado ponto para pegar carona em um trecho específico. O fato é que isso deve chegar ao transporte de cargas”, prevê.

De acordo com Schlüter, as alternativas de economia compartilhadas serão adotadas. O problemas, segundo ele, é que, apesar dos proprietários de empresas serem amigos entre si, nos menores escalões, é comum que haja competições mais acirradas. Por isso, o professor afirma que não existe probabilidade de migração completa de informações referentes aos clientes e tarifas de uma empresa para outra.

“Percebemos é que o Uber, por exemplo, e outras empresas aliadas ao Tesa e ao Google estão trabalhando em carros autônomos. O Uber não quer acabar com o táxi, quer angariar clientela para disponibilizar carros autônomos. Em última instância, dentro de um prazo de mais de 10 anos, se isso acontecer, será uma grande revolução também para o transporte de cargas”, revela.

Na avaliação de Schlüter, cada perda erradicada proporcionará ganhos de competitividade, melhoria dos processos, mas também relegará ao ostracismo as atividades que não estão em sinergia com os novos conceitos. Atualmente, o fator de dirigibilidade fora dos padrões gera prejuízos, seja por excesso de consumo, de manutenção ou de risco. Com o novo cenário, revela Schlüter, os cortes tendem a ser concentrados em empresas seguradoras, reguladoras e corretoras de transporte de cargas. Além disso, ele prevê diminuição de serviços ofertados pelas oficinas mecânicas e revendas de caminhões.

“A automação do processo de condução de caminhões proporcionará também a perda de postos de trabalho de motoristas que são funcionários das empresas de transporte rodoviário de cargas, bem como a diminuição da capacidade de competitividade dos caminhoneiros autônomos”, afirma.

Schlüter compara o panorama atual com os primórdios da chamada revolução verde, ou seja, a combinação de mecanização em plantio e colheita e adubação por defensivos agrícolas que elevou a produtividade no campo, mas dispersou a mão de obra.

“A profissão de caminhoneiro autônomo e de motoristas de longo curso vinculado à transportadora tende a desaparecer. É o mesmo processo que gerou o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST)”, diz o professor, ao lembrar que, atualmente, existe mais de 1 milhão de caminhoneiros autônomos e cerca de 200 mil motoristas de longo curso em atividade.

Tecnologia e treinamento são aliados da redução de custos

Em um universo ampliado, as tentativas do setor logístico para quantificar o tamanho dos estragos indicam que os prejuízos atingiram, em 2014, 11,19% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, ou o equivalente a R$ 618 bilhões. Do montante, cerca de R$ 392 bilhões são originados pelas perdas no transporte rodoviário.

Por isso, o cenário tem norteado uma série de ações da indústria, empresários, acadêmicos e profissionais ligados ao setor. O objetivo é gerar alternativas tecnológicas embarcadas e mudanças de comportamento capazes de amenizar uma parcela das despesas. Softwares inteligentes e investimentos em treinamento de pessoal são algumas das linhas de combate.

Na Scania, a preocupação com o desenvolvimento de tecnologias capazes de amenizar os custos, ampliar a segurança e reduzir as perdas com a dirigibilidade fora dos padrões é uma realidade há mais de uma década. Agora, conforme afirma o engenheiro de pré-vendas da Scania no Brasil, Jeferson Silva, a preocupação começa a frequentar o radar dos pequenos transportadores, que passaram a pesar as relações entre custo e benefício na hora de adquirir um novo caminhão.

Silva explica que a fabricante desenvolveu o conceito de Streamline, uma solução de transporte em que produtos e serviços são oferecidos em um só pacote ao cliente. A linha, disponível nas cabines rodoviárias já existentes, proporciona tudo o que a marca pode entregar em termos de economia de combustível, disponibilidade e rentabilidade.

Conforme o engenheiro de pré-vendas, os caminhões podem chegar a até 15% de redução de consumo de combustível em comparação com a linha Euro 3, pois trazem uma combinação formada pelos novos ganhos aerodinâmicos com defletores de ar, o eficaz trem de força e a nova caixa de câmbio Scania Opticruise. Em relação à linha Euro 5 tradicional, o Streamline pode proporcionar uma economia de até 4%.

Neste contexto, somente a caixa automatizada representa 2% da redução de custos, quando utilizada em seu modo econômico. O sistema lubrificante acrescenta outros 0,4% de economia. Para completar, a aerodinâmica da cabine unida a um pequeno defletor no lugar das antigas aletas laterais fica responsável por 0,6% do montante. Já o chamado Ecocruise – o piloto automático inteligente que auxilia o condutor a atingir os melhores desempenhos do caminhão tanto na subida quanto na descida – contribuiu com o 1% restante.

Silva ainda afirma que o conjunto de tecnologias destinadas à melhorias na utilização dos freios é capaz de reduzir em até quatro vezes o tempo de intervalo entre a trocas das lonas. “A tecnologia ajuda na manutenção do aprendizado dos condutores que passaram por treinamentos. Muitas vezes, depois de um certo tempo, os condutores voltam a praticar os mesmos vícios de direção. Com o pacote, há um lembrete constante para que se atinja sempre os melhores despenhos”, afirma.

Fonte: Jornal do Comércio

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