Avanço da economia, que surpreendeu analistas, foi obtido graças ao salto de 21,6% do setor agrícola. Consumo das famílias, porém, sobe apenas 0,2% e investimentos recuam 3,4%, sinal de que o ritmo não deve se manter
O Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil cresceu 1,9% no primeiro trimestre de 2023, na comparação com os três meses anteriores, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgados nesta quinta-feira (1/6). Foi a maior variação desde o último trimestre de 2020, graças à surpresa positiva do setor agrícola, que saltou 21,6% na mesma base de comparação, o melhor desempenho do segmento desde 1996.
O resultado positivo do PIB, que somou R$2,6 trilhões nos três primeiros meses do ano, ficou acima das expectativas do mercado. A mediana das estimativas dos analistas era de 1,2%. Diante da surpresa positiva, economistas estão corrigindo para cima as previsões para o PIB deste ano. A maioria passou a prever avanço perto de 2%. Conforme os dados do IBGE, o PIB cresceu 4% na comparação com o mesmo período de 2022 e, no acumulado de quatro trimestres até março, registrou avanço de 3,3%. O órgão revisou a queda do PIB do quarto trimestre do ano passado de 0,2% para 0,1%.
Ranking
O crescimento do primeiro trimestre colocou o Brasil em quarto lugar em um ranking de 61 economias listadas pela Austin Rating. Na liderança, ficou Hong Kong, com expansão de 5,3%. Na sequência, Polônia e China, com taxas trimestrais de 3,8% e de 2,2%, respectivamente. Na América Latina, a Colômbia foi o país com o segundo melhor desempenho, depois do Brasil, registrando avanço de 1,4%. Os Estados Unidos ficaram em 9º lugar, com alta no PIB de 1,3%.
O presidente Lula comemorou o resultado e afirmou que a economia “está melhorando”. Na visão de analistas, contudo, o fato de a economia estar crescendo, mesmo com a taxa básica de juros (Selic) em 13,75% ao ano desde agosto do ano passado, dá mais argumentos para o Banco Central manter o atual ritmo da política monetária e só iniciar o ciclo de redução dos juros no segundo semestre.
“Foi uma surpresa muito positiva. Claro que o agronegócio ajudou bastante e está segurando a economia. Mas, tanto o investimento quanto o consumo das famílias que, somados, representam algo entre 85% e 90% do PIB, desaceleraram. Isso acaba naturalmente tendo um efeito além da política monetária, o que não será garantia de que esse bom desempenho prossiga no segundo semestre”, alertou o economista-chefe da Austin Rating, Alex Agostini.
“Esse resultado acima do previsto enfraquece o argumento político de que o país está sofrendo. Existe um choque positivo de oferta e o Banco Central olha para isso de forma neutra e com um viés conservador, porque as expectativas de inflação ainda estão desancoradas”, disse Marco Caruso, economista-chefe do Banco Original. Ele espera queda dos juros apenas entre outubro e novembro.
Revisões
Após a divulgação dos dados, o economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, elevou de 1,3% para 2,1% a previsão de crescimento do PIB deste ano. “Não vai ter menos do que isso. Seria preciso uma recessão”, disse ele, que classificou o resultado do trimestre como “uma bela surpresa”. Contudo, Vale não descarta PIB negativo no segundo trimestre. “Seria uma queda 0,2%, o que é normal, porque é um efeito estatístico sobre uma base grande”, afirmou. Ele lembrou, ainda, que, nos próximos trimestres, fora do período de safra, vai ser difícil o agronegócio continuar ajudando no crescimento do PIB.
Alessandra Ribeiro, economista e sócia da Tendências Consultoria, adiantou que deverá elevar a estimativa do PIB deste ano de 1,4%, para 1,9%. “Os dados mostram uma resiliência maior na atividade econômica do que o mercado esperava. Mas estamos mais conservadores, porque a economia ainda deve desacelerar ao longo do ano. A saúde financeira das famílias não deve ajudar, porque o endividamento está muito elevado”, destacou.
A ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, admite ser possível que o PIB cresça 2,3%, neste ano, “se não houver contratempos”, e, com isso, é possível que o Ministério da Fazenda revise a atual previsão de 1,9% para a expansão da economia.
A economista Silvia Matos, coordenadora do Boletim Macro do Instituto Brasilerio de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV), faz projeções mais conservadoras e elevou a previsão de alta do PIB deste ano de 0,8% para 1,3%. Ela lembrou que, se não fosse o agronegócio, a expansão da economia no trimestre teria sido 1,2 ponto percentual menor, ou seja, de 0,7%.
“Uma parte da economia está se beneficiando desse resultado positivo, mas ainda existe um outro lado que não está vendo esse PIB mais robusto: aqueles que não estão recebendo aposentadoria com correção acima da inflação, não têm assistência do governo e não conseguem empréstimos porque o crédito está muito caro”, afirmou a economista do Ibre.
Apesar das revisões para cima, analistas ressalvam que o desempenho mais favorável do PIB aconteceu do lado da oferta. Do lado da demanda, os números são preocupantes e refletem o aperto da política monetária, especialmente os investimentos, que caíram além do esperado.
Investimentos
A Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), que mede os investimentos na economia, recuou 3,4% no primeiro trimestre na comparação com os últimos três meses de 2022. Outro termômetro de investimentos são as importações, que desabaram 7,1% no trimestre, na mesma base de comparação. “Isso quer dizer que as empresas não estão comprando insumos para ampliar a produção”, alertou Silvia Matos. Ela lembrou que as exportações também registraram queda, de 0,4% no trimestre.
O consumo das famílias, apesar de registrar crescimento de 0,2%, apresentou desaceleração em relação aos trimestres anteriores, mostrando a perda de potência desse importante motor de crescimento da economia. O consumo do governo manteve-se praticamente estável, com alta de 0,3%.
Fonte: Correio Braziliense/ Foto: Foto: Paulo Fridman/Corbis via Getty Images